[Longa] Crônica #2: O músico de estúdio [+18]

Ela, Samira, estava na minha frente dançando ao ritmo da música de seu cantor favorito que fazia um show ao vivo em mais um desses programas de tardes inteiras de domingo. Eu, sentado em minha poltrona, apenas admirava-a enquanto ela me convidava, de forma excessiva, para dançar junto com ela. Cansada, caiu de joelhos sobre o felpudo tapete.

- Vamos, dance, é tão divertido.
Neguei com a cabeça.
- Não seja chato Diogo.
Tornei a negar.
Perdida, olhou para os lados, para minha pilha de discos. Se alevantou e percorreu a sala, descalça.
- Você tem tantos discos, toca vários instrumentos, por que não trabalha com música? - sua voz de menininha inocente e espoleta deixavam-me confuso cada vez que eu precisava respondê-la.
Sai da poltrona e fui até ela. Estava tirando e colocando LP na estante, puxa, guarda, sopra, abre, vê.
- Vamos, Sam, 20h00min h vai começar o filme.
Foi até a sala de jantar pegar sua camisa xadrez que estava pendurada na cadeira, voltou, atravessou a sala novamente foi até atrás do sofá, calçou sua sapatilha e finalmente veio até mim.

Saímos de minha casa. Em poucos minutos dentro do carro, ela ligou a rádio.

...dor eterna
Magoa profunda
Mais ainda é minha querida
...
Minha eterna amada...

A mesma música que tocará na televisão. Era mais sucesso extraordinário de mais um cantor de discografia curta. Tocava em tudo, TV,  rádio, web sites, e de forma tão maçante que eu ficava impressionado com a capacidade da massa não enjoar em uma semana.

- Antes - falou Samira, empolgada com a música - todos reclamavam que as músicas pop não tinham letras, mas Julio Ribeiro conseguiu mudar isso. - deu uma pausa - Ele conseguiu unir letras românticas, mas sem deixar a melodia chata.

Inteligência, bons argumentos não era algo que faltava em Samira, mas me entristecia era ouvir frases tão bem feitas com um tema nem tanto.

- Com certeza, Sam, Julio foi uma peça importante para a mudança do eixo de estereótipos.
Como estava parado no semáforo. Olhei para os olhos de Samira.
- O que você gosta tanto na musica de Julio, Sam?
Ela cantarolava.
- Sei lá. Talvez os versos... São lindos, mais sem serem chatos, sabe?
- Aham - distraído com as belas coxas de Samira, demorei em arrancar com o carro e acabei levando algumas buzinas e xingamentos. Mais a culpa não é minha, quem mandou andar com um shortinho jeans e ter um corpo cheio de curvas?
Samira era uma menina de 18 que eu havia conhecido a pouco tempo em um show. Ela tinha cabelos castanhos longos e ondulados. Tinha covinhas e um grande sorriso. Perfeita. Por ser baixinha era fácil achar que ela tinha apenas 16. Sim eu também me enganei.

 Logo após o filme, que terminou por volta das 21h45min h, e um passeio no parque, nós estávamos novamente em meu carro.

Nós estávamos rindo e relembrando do filme que era de comédia.

- Então Diogo - rindo - você não me respondeu minha pergunta.
Mesmo estando em clima descontraído fiquei com medo de que aquela pergunta fosse alguma indireta por falta de atenção ou algo do gênero. Virei rapidamente o rosto para ela.
- Qual pergunta?
- Por que você não trabalha com música? - virando-se totalmente para mim, colocando a perna sobre o banco com o joelho dobrado - Com o quê você trabalha?
Que alivio.
Dei uma leve risada. - Sam, eu sou músico.
- Aí que massa... Mais você não faz show, não tem uma banda como pode ser tão rico?
- Eu sou de estúdio, mais também trabalho com muitas outras coisas.
- Coisas, hum... Quais?
- Compositor, técnico de som e produtor, mais também trabalho na literatura.
- Nossa... Você trabalha muito. Ainda mais em duas áreas como a música e a literatura.
- Trabalhoso, mas não estressante.
- Tá bom Diogo, você, escritor?
- Sim
Ela começou a rir.
- Não minta Diogo. Nunca vi um livro com seu nome.
- Conhece João Paulo Cardoso?
- Sim... - após alguns segundos parece que deu um estalo de entendimento nela - Sério que é você? Sério?
- Sim, sou eu. Uso um pseudônimo.
- Por quê? Teu nome deveria ser reconhecido e não um falso.
- Ah... Coisa de artista. - debochando
Sam caiu na gargalhada.
- Bobo.
Também comecei a rir
- Sam, mais o João Paulo não são o meu único pseudônimo. Tenho vários outros.
- Então "tá" - rindo - um legitimo Fernando Pessoa.
E mais risadas.

Chegamos a minha casa.

Fomos ao meu quarto aos beijos e agarres. Sam pulos em cima de mim e abraçou-me com suas pernas na minha cintura, tirando a camisa. Rasgou a minha. Não tinha importância.
Subir as escadas deveria ser difícil enquanto tem que beijar, cariciar, falar, segurar ela sobre meus braços, mas anos na academia e músculos acumulados deveria servir para alguma coisa.
Meu quarto estava escuro e só era iluminado pela luz lunar que passava pela janela. Caímos na cama. Sem roupas, luxuria, excitação. Movimentos rápidos, cuspi, xingamentos. Uma noite de selvageria e sacanagem, fora dos padrões, gritos e berros. Estase, ternura, orgasmo, sensações, muitas contrações, calma, respiração funda.
Após o ato, uma imagem percorreu meus olhos. Era Sam, molhada, sentada no chão de piso dourado. Ao redor pilares que seguiam em ordem até formarem um circulo. Na sua frente uma piscina redonda e ao fundo da sala estava saindo da penumbra, que era quebrada por momentos pelas luzes de velas presas nos pilares, um homem. Este passara por mim e, de degrau em degrau, entrou na piscina. Eu estava sem movimentos, apenas via a cena. Sam olhava para mim com um sorriso tímido e sobrancelhas arqueadas de leve, uma mistura de sentimentos e de repente tudo ficou tudo preto. Acordei. Já era de manhã. Levantei-me, olhei pela janela, estava nublado.

 Sam estava dormindo, nua. Fui em direção do banheiro, lavei o rosto, escovei os dentes. Voltei ao quarto, peguei uma pilha de roupa e fui tomar banho. Sai do banho e me vesti uma camisa branca, jaqueta de couro preta e calça jeans.

- Vai trabalhar? - perguntou Samira, ainda na cama.
- Sim.
- Mais - ela se sentou na cama - é Sábado.
- Eu só preciso escrever uma música - olhei no meu relógio de pulso, era 10: 37 h - antes do meio dia eu termino.
Ela voltou a deitar na cama.

Eu estava no meu estúdio, sentado numa cadeira com o meu velho caderno de letras na mão em meu processo criativo. Este se baseava em escrever os dois primeiros versos como eu quisesse, sem preocupações, e depois achar a palavra que rimava e dai sim formar o verso com aquela palavra que eu havia pensado.
Escuto três batidas fracas na porta. Fui um pouco para o lado que pude ver quem era entre a semi-abertura da porta, era Samira. Ela entrou um pouco tímida com uma xícara na mão. Sentou numa banqueta ao lado da minha e entregou-me a xícara.
- Então você realmente é músico?
Dei um longo gole
- Sim, mas como você havia dito não tenho banda ou canto. Então vendo os direitos.
Ela tirou o caderno de minha mão e começou a folhear até parar em uma página.
- Minha eterna amada? É a música do...
- Isso mesmo. É a dele. Alias esta que estou escrevendo também é para ele.
Ela deitou as sobrancelhas em sinal de dúvida.
- Humm... Duvido?
Arqueei o meu corpo em direção do dela para dar um beijo, mas fui interrompido com seu dedo na vertical, sinal de silêncio, sobe meus lábios.
- Antes disso terá que provar que realmente é o compositor respeitável.
Fiz silêncio por alguns instantes.
- Pare de ouvir a rádio a partir de hoje e só retorne mês que vem.
Ela começou a rir
- Então daqui um mês vai tocar uma música nas rádios exclusiva para mim?
Confirmei com a cabeça.
Ela se alevantou.
- Diogo, sei que só nos veremos semana que vem. Então - me deu um selinho - vou continuar minha vida. Tchau.
E saiu pela porta.
Continuar minha vida... Não somos casados ou namorados, não preciso dar explicações sobre minha vida sexual.

Eu estava numa mesa rodeado de amigos. Estava como convidado em mais uma festa de mais um de meus clientes. Eu sempre tive a sorte de manter uma relação de amizade com os interpretes que compravam minhas letras, tornando-se um amigo e assim acabava sendo convidado todo final de semana para alguma festa particular ou social. Mesmo sendo bem sucedido, eu ainda era desconhecido, mais por sempre estar em mesas "privilegiadas" e rodeado de artistas, eu sempre tive muitas mulheres. Não posso negar, era ótimo ser desconhecido. Normalmente tenho a acompanhante que desejo e não preciso me expor.
A desta noite chama-se Dani, só isso “Dani", não sei mais nada ao seu respeito apenas que era uma linda morena de corpo escultural.

Convidei-a para irmos para outro local. A expressão foi bem entendida. Logo no carro já começou a luxuria. Do seu ponto de vista pode parecer escroto, mais cada um de nós masturbava o outro. Em instantes eu já recebia um sexo oral ali mesmo, com o carro em movimento. Para alguns poderia ser difícil dirigir, mas sem ignorar totalmente a garota, não para mim. Quando se pratica muitas vezes a mesma ação você acaba ganhando habilidade. Mesmo chegando ao portão do motel ela não se intimidou e continuou ali. A cena foi vulgar para a "Dani", embaraçosa para o guarda e uma ótima história para mim. Entrei no estacionamento, fomos ao saguão, peguei a chave do quarto e subimos. Acostumado a nunca ter tido um relacionamento sério e apenas sexo casual, não era de meu gosto fazer as "coisas românticas", indo devagarzinho para excitá-la. Não muito diferente da noite com Samira, nesta também o calor subiu rapidamente. Joguei-a sobre a cama e avancei apressado retirei seu vestido rápido. Não demorou muito e já houve a penetração. A cama rangia, ela gemia, eu controlava a respiração para não gozar tão rápido, mais também elogiava, xingava em outros momentos. Sem amor ou carinho, apenas desejo. Cada vez mais rápido. Cada vez mais forte. Gentil fora da cama, mas nela um grosso. Tapas, pressão, velocidade, força, puxões e mordidas. Após a ejaculação aquele sonho que eu tinha todas as vezes que terminava o ato, ou seja, quase todas as noites. Era a Dani sentada sobre o mesmo piso de azuleijo cor púrpura com o cabelo molhado. Atrás dela havia uma piscina redonda no centra daquela sala rodeada de pilares. Saindo da penumbra era eu. Algo estranho, mais essa não era primeira vez em que eu me via nestes "sonhos". De costas para mim eu entrava na piscina e de repente tudo preto. Acordei.

Já havia amanhecido. Estava fazendo sol naquele Domingo. O quarto era iluminado pela janela com a luz forte do sol. A Dani estava deitada de bruços. Na verdade nunca vi uma mulher dormir em outra posição, estranho. Ela estava com sua langeri.
De forma um tanto grosseira, logo após o banho, deixei dinheiro encima do criado-mudo, o suficiente para o táxi. Fui ao saguão, paguei à diária e fui embora.

E a minha vida seguiu neste ritmo. De dia trabalha, tocando, compondo, escrevendo. À noite, balada, bebidas, mulheres e sexo e depois sempre a relação amorosa eu tinha o sonho, na maioria eu é que entrava na piscina. Apenas com poucas mulheres não era eu, Thais, Camila e Samira mais precisamente. E neste meio termo eu componho a música para Samira.

Um mês após a aposta fui até casa de Sam. Bati na porta, ouvi um grito ao fundo - Entre - e girei a maçaneta. Assim que entrei na sala vi Sam sentada em uma poltroninha com os pés sobre o espaço entre a parede e a janela redonda. Eu cumpri minha promessa: escrevi uma música dedicada a ela e ainda mais estava presente no álbum ressente de seu artista favorito, Samuel Fariz. Ela girou a poltrona e ficou de
frente para mim, alevantou-se, deixou o livro "Sonho real", um romance que contava a história de um advogado boêmio que tinha o dom de ver se uma mulher estava apaixonada por ele através de seus sonhos logo após as relações sexuais, Contava a minha história, sobre a mesa. O autor era Paulo Samael Malzezu, outro dos meus pseudônimos. Quando chegou perto, sem falar nada, Sam me beijou e de seu jeito dominante foi me deitando ali mesmo no chão. Somos adultos, não eram necessárias palavras, perguntas, respostas, medo ou timidez. Aconteceu de forma espontânea. O desejo foi grande. Os músculos trabalhavam, o suor escorria. Gemidos, respiração e o som de músculos se chocando eram os únicos naquela casa. Foi longo, calmo, tranquilo, paciente. Não houve gritos, tapas, mordidas, saliva, pele no pêlo. Estamos ainda de roupa. O chão de madeira nunca foi tão confortável e macio. Como de costume o sonho aconteceu. Sam molhada, sentada e a piscina, mas finalmente consegui o que eu tanto almejava: Era eu quem estava entrando na piscina. Senti pressão e saliva sobre meus lábios, acordei. Era Sam me beijando. Ele parou ergueu a cabeça e disse.
- Te amo.